Resumo: Artigo 35764
A Educação CTS e a Engenharia de Alimentos (11, 14, 63, 74, 78)
Lais Fraga, Renato Dagnino, Universidade Estadual de Campinas, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 211 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 23 - Chair: Irlan von Linsingen
Abstract.
A necessidade de repensar a formação do engenheiro tem sido ressaltada por autores que criticam a concentração dos currículos em aspectos técnicos em detrimento dos aspectos sociais e políticos. O que levaria engenheiros a atuar de forma limitada diante da complexidade das relações entre ciência, tecnologia e sociedade. Partindo desse entendimento, este trabalho analisa o currículo do curso de graduação da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) à luz da Educação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) e, a partir dessa análise, refletir sobre a formação em engenharia. A referida análise foi feita em duas principais etapas. Primeiramente, as disciplinas foram classificadas a partir de quatro tipos de disciplina, elaborados por meio da combinação de três critérios: ênfase nos aspectos técnicos, aplicabilidade do conteúdo e flexibilidade da disciplina. Os quatro tipos de disciplina obtidos são: básica, aplicada, múltiplos aspectos e fechada. Essa etapa apontou que o currículo possui as É um curso tecnicista: essa característica está-seguintes características: ligada à imensa maioria de conteúdos puramente técnicos e à ausência de determinadas disciplinas indicadas pelo Ministério da Educação (humanidades, Apresenta forte-comunicação, metodologia de pesquisa, administração etc.); separação entre teoria e prática: a separação entre disciplinas básicas/aplicadas e gerais/específicas aponta para essa característica. Além disso, a organização do currículo (primeiro, disciplinas básicas e gerais; depois, aplicadas e específicas) mostra uma priorização da teoria em detrimento É um curso-da prática. A prática só tem valor se embasada pela teoria; fechado: significa dizer que há pouca possibilidade de um estudante escolher diferentes caminhos ou enfoques para o curso. A grande maioria das disciplinas é Apresenta como foco a indústria: não há no currículo da FEA nenhuma-fechada; disciplina que apresente um foco para os conteúdos abordados, a não ser para o uso industrial desses conteúdos. Isso significa dizer que ou o conteúdo é tratado de maneira geral ou com foco na indústria de alimentos. A segunda etapa consistiu numa interpretação desse resultado à luz das críticas que a Educação CTS faz à educação tecnocientífica convencional. Foram utilizadas contribuições de Gordillo e Galbarte (2002); Gordillo, Osório e Lopéz Cerezo (2000); e Dagnino (2006). A conclusão indica que as críticas feitas pela Educação CTS são pertinentes ao curso da FEA: que ele traz implícita uma visão instrumentalista (neutra) de tecnociência e que, por ter como foco a indústria, não é plural. O contraste do resultado alcançado com a idéia de onde se partiu, de que a ausência de uma formação humanística não prepara o engenheiro para a crítica do sistema socioeconômico e político em que está inserido, levou a outra conclusão: não parece que a introdução de humanidades no currículo seja capaz de torná-lo mais plural. Isto é, de proporcionar ao engenheiro a capacidade para conceber formas tecnológicas que atendam a outros atores que não os que formam a indústria. A análise feita mostrou que a forma como os conteúdos são apresentados e a forma como o currículo está organizado dificultam a possibilidade de o aluno atuar como cidadão. Isso porque ele é induzido pela via técnico-científica a não questionar o status quo e muito menos a ter a capacidade de mudá-lo. Partindo da neutralidade da tecnociência, tanto a formação quanto a atuação do engenheiro passam a ser únicas, isto é, não são passíveis de questionamento e são as mesmas para qualquer visão de mundo. A análise, embora baseada em um estudo de caso, nos leva a uma reflexão: as características apontadas pela análise realizada ficaram mais evidentes no currículo da FEA, no entanto, características semelhantes foram constatadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia, de 2002. Por isso, está colocado para a Educação CTS um desafio de grandes proporções. O campo deve promover as bases educativas para que engenheiros sejam capazes de agir indo à raiz do problema e de reprojetar a tecnociência segundo a sua visão de mundo. O que falta na formação da engenharia não é a adição de conteúdos de humanidades nem ética na sua atuação. A contribuição (e a responsabilidade) da Educação CTS para a formação de engenheiros está em evidenciar os mecanismos de manutenção da idéia da tecnociência neutra da educação convencional e, a partir disso, propor caminhos alternativos para uma educação tecnocientífica de fato socialmente referenciada.